Friday, February 3, 2012

O Cauim


Se questionar quando foi feita a primeira cerveja brasileira muitos responderão por volta de 1800 e alguma coisa, tudo bem se considerarmos que os requisitos para se produzir uma cerveja sejam cevada, lúpulo e afins, só que não podemos negar que os já moradores das Terras Brazilis dominavam técnicas de fermentação para produção de bebidas alcóolicas há alguns mil anos.
Presente em cerimônias e festas de diferente temática, de acordo com a tribo, o Cauim era consumido intensamente por várias etnias Tupis. Para os Tupinambás (uma das maiores nações indígenas brasileiras, que dominava grande parte da costa atlântica), as festas regadas pelo fermentado geralmente marcavam a vitória de uma batalha, quando o ápice da cerimônia seria o ato de antropofagia sobre inimigos aprisionados. Atos que os colonizadores recriminaram ao máximo, porém só conseguiram inibir o canibalismo, pois a maioria das festas dos brasileiros ainda hoje é feita à base de muita cerveja e teores etílicos muito superiores.
Uma geral semelhança entre todos os Tupi-Guaranis é o, a principio excêntrico, modo de confeccionar a bebida. O Milho ou em geral a Mandioca são cozidos até ficarem bem macios, então as mulheres, moças e meninas se reúnem em torno do tacho, colocam uma porção na boca, mastigam e então retornam para outra panela, a mistura é levada ao fogo novamente e fermentada por cerca de três dias. Soa um pouco estranho a primeira vista, mas pensando em outros exemplos de uma forma geral e deixando frescuras de lado, no princípio o saquê oriental era feito com este mesmo método, só ao que me consta os incumbidos eram os homens mesmo, já o índios dizem que se os homens fizerem o Caium não fica bom. Outro exemplo mais clássico é o vinho, originalmente o processamento da uva era feito em grandes tonéis onde os homens e mulheres a pisoteavam, não sei o que é pior imaginar, de botas ou descalços, já que os banhos na Europa nessas épocas não eram tão frequentes. A fermentação ideal do Cauim necessita de enzimas presentes na saliva bocal para transformar o amido em álcool.
Uma relação muito interessante que fazem os Waiãpi (etnia do tronco macro-tupi que viviam onde hoje são os Estados do Pará e Amapá), é associá-lo a outra bebida da imortalidade, o mel, colhido já em um estado de fermentação e também regurgitado pelas abelhas. Já para eles as cauinagens ocorrem para marcar e celebrar momentos mais pacíficos, como o término de uma caça, plantio ou colheita. Seus rituais são regidos aos sons de flautas chamadas Turês, que têm a função de manter a distância necessária entre o céu e a terra, de definir a diferença entre os espíritos dos mortos e aqueles que estão se projetando para fora de seus corpos sob o efeito do Cauim.
Com relação à origem da bebida Claude Lévi-Strauss relata brevemente um mito Tikuna (tribo que habitava terras próximas ao rio Solimões), associando o cauim à bebida da imortalidade:
Uma festa de puberdade estava chegando ao fim, mas o tio da jovem virgem estava tão bêbedo que não podia mais conduzir as cerimônias. Um deus imortal apareceu sobre a forma de um tapir. Levou a jovem e casou-se com ela.Muito tempo depois, ela voltou à aldeia com seu bebê e pediu aos parentes que preparassem uma cerveja especialmente forte para a depilação de seu irmão mais novo. Ela assistiu a cerimônia em companhia do marido. Ele havia trazido um pouco de bebida dos Imortais e deu um gole a cada participante.Quando todos ficaram ébrios, partiram com o jovem casal para se instalarem na aldeia dos deuses.
A bebida que sempre é servida pelas mulheres em cumbucas cheias, nunca é recusada, é habito um participante se ausentar para vomitar e poder retornar para beber mais. O preparo muitas vezes é adicionado de frutas, como o caju, e a base de milho ou mandioca também pode ser substituída por plantas e fungos da floresta, é conhecido também como Caxiri, Casili e Caxixi. Essas bebidas não são consideradas alimento e um detalhe interessante é que os Índios nunca bebem enquanto comem, acham esse costume ocidental bem estranho.
Os peruanos possuem bebidas fermentadas de milho muito similares, caso das Chichas, em Cuzco tive a oportunidade de provar uma autentica Frutillada em uma Chomba, restaurante típico e popular peruano, lá a bebida feita no próprio estabelecimento era acrescentada de morangos, parecia uma vitamina de leite batido, muito espessa, rústica, refrescante e riquíssima, ao beber sentia pinicar a língua por causa da fermentação, disseram que na parte da noite o grau alcoólico vai se elevando, devido a fermentação natural que vai ocorrendo durante todo o dia, acho que bebi só umas quatro, não me lembro muito bem. Neste restaurante a bebida era servida em grandes copos em formato que lembrava o Kero, item de cerimônias Incas, no país encontra se muitas versões de Chichas, as mais freqüentes feitas com o Choclo morado, tudo parte do grande Legado Quechua.

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